Por Pedro Parisi, de Belo Horizonte
Neste primeiro episódio da série Clínica Técnica CIMTB Michelin, conversamos sobre ciclismo durante a pandemia com três treinadores brasileiros. Essa dinâmica acontecerá em todos os outros episódios sempre alternando os profissionais da área e dando oportunidade a todos os que quiserem contribuir com seus conhecimentos para os praticantes de ciclismo de maneira geral.
Os treinadores Júlio Cézar Machado, Hélio Souza e Cadu Polazzo falaram sobre os novos desafios dos atletas amadores e profissionais no ambiente de isolamento social e as incertezas no calendário de competições. Eles ainda deram dicas sobre como treinar nessas condições e como estar preparado para quando as competições voltarem a acontecer.
Cadu é mestre em Ciências da Motricidade e graduado em Educação Física pela UNESP. Ele trabalha com treinamento de atletas de mountain bike há 20 anos. É o técnico da seleção brasileira de mountain bike desde 2009, e tem dezenas de títulos em todas as categorias, tanto femininas, quanto masculinas.
Hélio é graduado em Esporte pela USP e Mestre em Ciências pela ICB-USP. Ele se destaca por ser treinador de grandes nomes do MTB como o líder do ranking mundial de XCO, Henrique Avancini, Raíza Goulão e Márcio Ravelli.
Júlio é mestre em biomedicina e utiliza conhecimentos acumulados em décadas de experiência para entender profundamente os impactos fisiológicos dos treinamentos nos atletas. Para isso, aplica testes avançados de VO²max, potência e exames de sangue.
A importância do treinador
Atletas e técnicos estão tendo que se adaptar e criar maneiras diferentes de organizar os planejamentos. Além das dificuldades de manter a regularidade nos estímulos por causa da falta de provas, os profissionais precisaram repensar as cargas e onde encaixar os períodos de maiores volumes e intensidades.
“A primeira grande questão com a motivação neste momento é a relação entre o atleta e o treinador. A minha forma de trabalho é de muito contato com os atletas, muita conversa, muito diálogo”, diz, Júlio.
Ele explica a importância dos atletas compreenderem quais são as bases e os fundamentos científicos sobre o treinamento visando a performance. Isso é fundamental para não desanimar. E por isso, é essencial ter um profissional orientando o desenvolvimento, sobretudo a partir de um certo nível.
“O atleta amador consegue se desenvolver bem sozinho. Porém, vai chegar num certo ponto em que ele para de evoluir. É o que chamamos de platô, e a partir daí, só um treinador é capaz de promover a melhora. Inclusive, o treinamento sem acompanhamento pode comprometer o potencial geral do atleta, mesmo que ele procure um profissional tardiamente”, alerta Júlio.
Estratégias de treinamento
Uma das estratégias que facilitam manter a motivação, de acordo com Cadu é a fragmentação dos objetivos. “Existem dois tipos de estímulos psicológicos, o intrínseco, criado pela própria pessoa e o extrínseco, que vem de fora”, explica.
Ele conta que fica mais estimulante quebrar os objetivos em mensais, semanais e diários, pois com uma meta mais próxima as pessoas conseguem se manter mais motivadas. “E além disso, o treino tem que ser algo divertido, estimulante. O atleta tem que sair do treino se sentindo vitorioso. Isso aumenta a autoestima e a confiança”.
Cadu tem inserido atividades diferentes nas prescrições para tentar substituir o estímulo externo das competições, que minguaram no último ano. “Tenho indicado atividades que incluem trechos do Strava, que acaba sendo uma forma de competição, sobretudo quanto aos recordes pessoais, também metas individuais de sprints e subidas. Outra ferramenta muito útil tem sido os pedais virtuais com o rolo smart. Nós marcamos competições e treinos no Swift justamente para substituir os pedais em grupo e provas”, lembra Cadu.
Fisiologia do atleta
Um fator que preocupa os treinadores de forma unânime neste período é a perda das adaptações fisiológicas pelos atletas, algo que exige muito tempo para ser recuperado. “A melhora de performance toma muito tempo e dedicação. É preciso ter paciência. O treinamento é cumulativo. Atletas de esportes aeróbicos precisam de volume acumulado de treinamento”, avisa Júlio.
Quando um atleta para de treinar por um período médio ou longo, ele prejudica tanto adaptações centrais, relacionadas com o sistema cardiovascular, como periféricas ligadas aos músculos.
Segundo Cadu, é uma cadeia de melhoras físicas. O coração de uma pessoa bombeia, em média, 100 ml de sangue por batimento. O de um atleta amador chega a 130 ml, e em casos de competidores de alta performance, 160 ml.
Outras partes do sistema passam a ficar mais eficientes para receber esse volume maior de sangue enviado pelo coração, então, o sangue também aumenta a quantidade de hemácias para transportar mais gás, e as fibras internas dos músculos se tornam mais capazes de processar esse oxigênio, além de armazenarem mais recursos energéticos, como o glicogênio.
O resultado desse ciclo, é que o atleta consegue realizar estímulos aeróbicos mais intensos e por mais tempo. “Esses processos não acontecem de uma hora para outra. A gente precisa desse tempo para treinar. Se você para agora, você não vai atingir o potencial genético que você teria. É importante plantar agora, para colher lá na frente”, alerta Cadu.
Equilíbrio dos profissionais
Tanto para amadores quanto para profissionais, a falta de competições impacta diretamente no treinamento. Se amadores precisam de estímulos para não desacelerarem, os profissionais enfrentam outros tipos de ansiedade. A cobrança de patrocinadores e medo de perder apoio por conta da falta de visibilidade estão entre os maiores problemas.
E por causa disso, eles precisaram aproveitar esse período para descobrir novas formas de trabalhar. “Abrimos o leque para experimentar coisas que ao longo da temporada normal, a gente não conseguiria, porque, com as competições, você tem uma margem de erro muito menor”, conta Hélio.
Ele explica que as provas são o ponto fundamental para o desenvolvimento do atleta, então ele precisa estar preparado, e ao mesmo tempo descansado para esse dia. Isso exige um período de recuperação antes e após os eventos. Sem isso, ele avalia que os atletas, sobretudo os profissionais, têm a possibilidade de treinar ainda mais na pandemia, já que eliminam esses intervalos.
Esse contexto, segundo ele, gerou um paradigma sobre qual seria a carga e a preparação ideal para que os atletas cheguem nas competições equilibrados, quando as coisas voltarem ao normal. “Eu acredito que muitos vão se sobrecarregar, e quando voltarem as competições, até terão bons resultados no início, mas que não devem se sustentar ao longo da temporada. Quem conseguiu usar esse mais de um ano de pandemia para se preparar com uma leitura correta da realidade vai fazer uma temporada muito boa, mas quem se afobar, pode pagar no médio prazo”, alerta.
Mercado do ciclismo
Apesar do desânimo dos competidores amadores e a mudança no ritmo dos profissionais, o mercado da bike pode estar vivendo um momento único, segundo a visão de Hélio. A bicicleta passou a participar da vida de muita gente que preferiu fugir dos transportes públicos.
“Muita gente que não pedalava passou a pedalar nesta quarentena. Claro que num ambiente muito diferente das competições. Mas eu tenho certeza que boa parte dessas pessoas vai continuar. O ciclismo tem um ambiente muito atraente, tem as características sócioafetivas”, avalia Hélio.
Ele ainda destaca que, boa parte desse ambiente positivo é criado por eventos como a CIMTB Michelin. “E eu sempre gosto de destacar a importância dos eventos de ciclismo para perpetuar essa cultura positiva. Organizadores como o Rogério (Bernardes, da CIMTB Michelin), que olham para o mercado como um todo e incluem todas as categorias, pensam em entretenimento, atividades infantis, feiras, são essenciais para manter esse crescimento”, conclui Hélio.
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CIMTB Michelin 2021
A organização da CIMTB Michelin realizou sua primeira prova em 1996. Desde então, vem inovando e contribuindo ativamente para o crescimento e fortalecimento do mountain bike e o mercado de bicicletas no Brasil. Contando pontos para o ranking mundial da União Ciclística Internacional (UCI) desde 2004, a CIMTB Michelin tem sido seletiva para os Jogos Olímpicos nos Ciclos de Pequim 2008, Londres 2012, Rio 2016 e Tóquio 2020. Em 2022, a CIMTB Michelin aumentará ainda mais sua relevância internacional com a realização da etapa de abertura da Copa do Mundo de Mountain Bike 2022, em Petrópolis. Além disso, foi responsável pela construção da pista de mountain bike dos Jogos Olímpicos Rio 2016, considerada uma das melhores da história dos Jogos desde 1992.
Michelin
A Michelin, líder do segmento de pneus, se dedica ao desenvolvimento da mobilidade de seus clientes, de forma sustentável, criando e distribuindo os pneus, serviços e soluções mais adequados às suas necessidades; fornecendo serviços digitais, mapas e guias, para ajudá-los tornar suas viagens experiências únicas; e desenvolvendo materiais de alta tecnologia, que atendem à indústria da mobilidade. Sediada em Clermont-Ferrand (França), a Michelin está presente em 170 países, emprega 114.100 pessoas em todo o mundo e dispõe de 70 centros de produção implantados em 17 países diferentes que fabricaram 190 milhões de pneus em 2017.
Sense Bike
Parte da Lagoa Participações, a Sense Bike foi criada em 2009, com o sonho de construir uma marca de bicicletas feita por apaixonados para apaixonados, com padrão internacional, foco em desenvolvimento e indústria de ponta. Em 2014, foi inaugurada a fábrica em Manaus, que possibilitou o início da produção de quadros, bem como a montagem de bicicletas elétricas e convencionais (mountain bike, urbana e road), com o que existe de mais inovador em tecnologia. Em abril de 2018, a Sense Bike comprou a Swift Carbon Global, importante fabricante mundial de bikes em fibra de carbono, com operação industrial na cidade do Porto (Portugal).