Por Pedro Parisi, de Belo Horizonte
São nada menos que 11 títulos brasileiros nas três principais modalidades do mountain bike. Adriana Nascimento foi uma das pioneiras do esporte no país, numa época em que cross country, downhill e maratona ainda eram quase que uma coisa só, e ela venceu em todas. As primeiras pedaladas desse percurso aconteceram quando ela tinha 15 anos, quando ganhou uma bicicleta da avó.
“Meu primeiro contato com o esporte foi em 1991, quando a Caloi estava lançando uma das primeiras mountain bikes brasileiras. O evento foi em Campos do Jordão, onde minha avó tinha uma pousada. Nessa época, os atletas que iam participar do evento se hospedaram na pousada, e minha avó trocou a hospedagem de um ciclista estrangeiro pela bicicleta dele”, lembra Adriana.
A atleta já treinava atletismo e planejava participar da Corrida de São Silvestre, mas a paixão pelo ciclismo foi fulminante. “Já nesse primeiro evento, fiquei em 3º lugar, e os gerentes da Caloi ficaram de olho em mim”, conta.
Ainda em 1992, quando praticamente não havia espaço para mulheres no esporte, Adriana começou a competir, na maioria das vezes, contra atletas mais velhas. “Naquela época não existia separação entre júnior e elite no Brasil. Corríamos todas juntas”, destaca.
E mesmo assim, ela se destacou no cenário nacional e mundial. Uma das primeiras competições com separação por idade foi o Mundial de 1994, nos Estados Unidos, onde ela teve a oportunidade de correr de igual para igual. O resultado foi um 4º lugar no XCO e 6º no downhill.
Mas o ouro internacional não demorou a vir. Em 1995, com a carreira de atleta já consolidada e títulos brasileiros no XCO e no Downhill, Adriana trouxe a medalha para o Brasil no Panamericano na Argentina, mesmo com as condições incipientes do esporte no país. “Na época era tudo na raça. Mesmo em uma equipe, a gente ainda não tinha treinamento estruturado e pouco apoio. Os atletas iam se ajudando como podiam. Quem me deu muitas dicas de treinamento no início foi o Erivan de Lima”, lembra Adriana do amigo que faleceu no ano passado.
Há quase 30 anos, a mentalidade do mountain bike era ainda mais masculina que atualmente, o que gerou algumas dificuldades para Adriana, com a família, com o mercado e com a seleção brasileira.
“A minha avó, a mesma que me presenteou com minha primeira bicicleta, achava que mountain bike era coisa de homem. Mas a maior dificuldade era encontrar equipamentos do meu tamanho. Tudo era enorme. As minhas primeiras sapatilhas eu precisava usar com duas meias e um pedaço de jornal enrolado na ponta”, destaca. “Até viajar com a seleção era difícil. Os dirigentes nunca queriam me levar porque dava trabalho. Eu tinha que ficar em quarto separado. Mas quando eles não queriam eu ia do mesmo jeito. Arrumava dinheiro e ia”, completa.
A Copa Ametur, que hoje é a CIMTB Michelin, foi um dos primeiros eventos a compreender a necessidade de dar importância para o ciclismo feminino, segundo Adriana. Com a chegada da indústria com mais força na segunda metade da década de 1990, as competições começaram a se profissionalizar e com isso, as equipes e os atletas.
“Os eventos começaram a ficar mais profissionais. E nisso, a Copa Ametur foi a que mais mudou esse cenário. Era a prova que tinha recorde de público, e isso começou a atrair patrocinadores. Foi a partir de então que atletas começaram a pensar como profissionais”, explica a veterana.
Agora, vivemos outro momento de expansão do esporte no Brasil. A pandemia trouxe milhares de novos ciclistas para o mercado. “Hoje, o público vê a bike como uma solução. Percebo isso claramente tanto no lazer, no transporte e nas competições”, avalia. “E a CIMTB encaixa direitinho nessa nova configuração porque é um evento pensado tanto para a família quanto para o profissional”, diz.
Com a base de atleta, a graduação em Educação física e a certificação de treinadora pela UCI, Adriana é uma das técnicas de ciclismo mais conceituadas do Brasil. Nos 13 anos como treinadora, já levou atletas ao ponto máximo, como a campeã brasileira de XCO, Viviane Favery.
Os desafios agora são outros. “Estamos desenvolvendo um projeto social e ambiental, que é mudar a realidade de uma comunidade da região, através de uma rede de trilhas. vamos construir e manter essa rede junto com eles. Um grande problema é a falta de manutenção das trilhas, muitos condomínios novos e as motos que destroem tudo. Então estamos preparando a comunidade para proteger nossas trilhas de Campos do Jordão”, conta.
O esforço de Adriana pelo mountain bike vai beneficiar os ciclistas de toda a região, e se soma ao trabalho da CIMTB Michelin, que está construindo três circuitos completos de alto nível em Taubaté, a poucos quilômetros de Campos do Jordão. As pistas de short track, XCO e maratona ficarão de legado para quem mora por lá. A competição será realizada entre 3 e 5 de dezembro, no Parque Municipal do Itaim, durante as comemorações de aniversário da cidade.